Lisboa, 3/11/1996 - «O Tao que pode dizer-se não é o Tao real. A verdade que se pode dizer, converte-se imediatamente em não verdade».
Tenho visto este sutra de Lao Tse como argumento atirado contra os que, como eu, muito escrevem, muito pensam, muito falam, muito pretendem ensinar do pouco que sabem.
Patrice Kerviel, por exemplo, com quem tenho a maior dívida de gratidão contraída nesta existência, indica o Sócrates como modelo e ela própria, ao contrário do pai, Etienne Guillé, nunca publicou nada do que pensa e diz.
Mas diz, o que já é ir contra o sutra radicalista do Lao.
Pois é. Acho que essa tão proclamada e recomendada virtude do silêncio e da abstenção - decorrente do radicalismo de Lao Tse (radicalismo que ele próprio quebrou no final da vida escrevendo esse conjunto de sutras que se chama «Tao Te King») vai dar belíssimos resultados nos negócios do sistema.
A balbúrdia a que chegámos em matéria de informação fundamental - ciências sagradas ou Noologia - é óptima para o sistema da Ciência Ordinária.
Nada como um bom slogan abstencionista do estilo Lao Tse, ou do estilo socrático silencioso, para os abutres do mediático, do virtual, do consumista e do «sacred show» tripudiarem completamente à vontade sobre os corações, as almas, os cérebros e os espíritos da malta.
Nunca se vomitará suficiente esta sociedade de merda, de consumo de merda e os mestres à penser que a inspiram. Lao Tse ajuda a consumir merda, então exaltemos Lao Tse.